Por Dom Vital Corbellini, Bispo de Marabá – PA.
A Palavra de Deus possui uma validade que não passa, é eterna a sua
normalidade porque ela provém de Deus Uno e Trino na qual ela visa à conversão das
pessoas e dos povos. Tudo o que sai da boca do Senhor e vem a este mundo não volta
para Deus sem dar o seu devido fruto (cf. Is 55,11). Jesus é a Palavra eterna do Pai em
comunhão com o Espírito Santo. Ele nos revelou o Pai: “Quem me vê, vê o PaI” (Jo
14,9). Nós estamos prestes a iniciar o mês bíblico, onde refletiremos a importância da
Palavra de Deus nas nossas comunidades eclesiais em vista da conversão de vida e pela
necessidade de realizar práticas de amor. Os primeiros escritores cristãos, os santos
padres perceberam a Palavra de Deus como compromisso para uma vida de santidade
no mundo para que assim o Reino de Deus crescesse sempre mais pelas suas atuações
junto às suas comunidades, às pessoas necessitadas e pobres.
As duas alianças.
Santo Ireneu de Lião, bispo, nos séculos II e III, afirmou que todos os apóstolos
ensinaram a existência de duas alianças para dois diversos povos; no entanto único e
idêntico é Deus que os concedeu para a utilidade dos seres humanos e à medida que as
pessoas creram em Deus 1 . O Antigo Testamento foi dado ao serviço divino, para o
louvor próprio do Senhor e esse era ao mesmo tempo um símbolo das realidades
celestes, pois o ser humano ainda não podia ver as coisas de Deus senão pelo seu Filho,
Jesus Cristo, vindo a este mundo, fundamentando o Novo Testamento 2 .
O Antigo Testamento cumpriu-se em Cristo Jesus.
Santo Agostinho, bispo de Hipona, séculos IV e V teve presentes as idades que
se cumpriram para a vinda de Cristo Jesus de modo que o Antigo Testamento deu o seu
cumprimento no enviado do Pai, o Messias. A primeira idade iniciou com a criação do
gênero humano e foi até Noé, pois com o dilúvio, ele construiu a arca 3 . O segundo
período foi até Abraão na qual ele foi chamado pai de todos os povos, de modo que o
imitaram na fé. Ele também estava ligado ao futuro povo de Israel, antes mesmo que os
povos acolhessem a fé cristã para que toda a terra adorasse o Deus verdadeiro e da qual
Cristo, o Redentor, viria da sua descendência segundo a carne 4 . Para Santo Agostinho
estas duas etapas são percebidas com toda a clareza já nos livros do Antigo Testamento.
O Evangelho de Mateus (cf. Mt 1,17) afirmou a descendência corpórea do Senhor Jesus
Cristo na realidade humana afirmada no Antigo Testamento (cf. Is 7,14) 5 .
Jesus Cristo revelou o Novo Testamento.
1 Cfr. Ireneu de Lião. IV,32,2. Paulus, São Paulo, 1995, pg. 470.
2 Cfr. Idem, pg. 470.
3 Cfr. Agostino. Come catecchizzare i principianti, 2, 39-40. In: La Teologia dei Padri, Volume IV. Roma:
Città Nuova Editrice. 1982, pg. 197.
4 Cfr. Idem, pg. 197.
5 Cfr. Ibidem, pg. 197.
O bispo de Hipona ainda disse que Jesus Cristo revelou o Novo Testamento da
hereditariedade eterna, na qual o ser humano novamente criado pela graça de Deus é
chamado a viver uma vida nova no amor do Senhor. Ele também mostrou que os
patriarcas, os profetas, as pessoas justas no Antigo Testamento almejavam em ver o
Messias, o Salvador da humanidade (cf. Mt 13,17). Assumindo a realidade humana,
como a fome, a sede, o sofrimento, a dor, a cruz, Ele chegou à glória da ressurreição,
para desta forma elevá-la até a divina, em vista da redenção de todas as pessoas junto de
Deus 6 .
Jesus Cristo é a salvação das pessoas justas do Antigo Testamento.
São Gregório de Nazianzo, bispo de Constantinopla, século IV disse que no
Antigo Testamento, muitas pessoas justas, profetas sofreram perseguições, foram
mártires ou mesmo viveram bem a lei do Senhor Deus acreditando na promessa divina
da salvação, como dom em unidade com Cristo Jesus. O caso dos Macabeus (cf. 2 Mc
7) que sofreram o martírio, passaram a paixão de Cristo, não a teriam assumido se não
fosse pela morte de Cristo por toda a humanidade. Eles imitaram o Senhor, mesmo não
o conhecendo antes. Desta forma nenhum deles teriam alcançado a perfeição, sem a fé
e a caridade em Cristo Jesus. O Logos, Jesus Cristo foi anunciado de uma forma
posterior, mas também isso antes ocorreu pelas almas das pessoas justas. Se eles não
conheceram a cruz de Cristo, no entanto viveram conformidade à cruz do Senhor e na
unidade da sua ressurreição 7 .
O Antigo Testamento em função do Novo Testamento.
São João Crisóstomo, bispo de Constantinopla, séculos IV e V afirmou que o
Antigo Testamento fosse lido em função do Novo Testamento. Para o bispo é
fundamental a palavra de São Paulo que diz que “Quando virá o que é perfeito, será
abolido aquilo que é imperfeito” (1 Cor 13,10). Isto valeu pelo Antigo Testamento por
causa do Novo Testamento, não que ele fosse imperfeito, mas a antiga aliança apontou
para a nova aliança. Desta forma, o Senhor exige de seu novo povo frutos e dons
maiores que o povo da antiga aliança, por causa da vinda do Messias, do Salvador.
Deus, em Jesus Cristo não prometeu mais ao ser humano uma terra onde fluía leite e
mel, nem uma longa idade, abundância de pão e de vinho, mas acompanhadas por obras
de caridade, o Senhor promete ao ser humano o céu, o paraíso, os bens celestes, a
dignidade de ser filhos e filhas adotivos no Pai, irmãos e irmãs no Filho Unigênito,
iluminados pelo Espírito Santo, participantes da sua gloria e do seu Reino 8 .
A Palavra de Deus é sempre viva e eficaz para a nossa vida de seguidores e de
seguidoras de Jesus Cristo, de sua Igreja e de seu Reino. Ela não irá passar (cf. Mt
24,25) porque ela é vida eterna em vista da conversão do ser humano e de sua salvação.
6 Cfr. Ibidem, pg. 198.
7 Cfr. Gregorio di Nazianzo. Discorso in lode dei Maccabei, 15,1-2. In: Ibidem, pg. 197.
8 Cfr. Giovanni Crisostomo. Commento al Vagelo di San Matteo, 16,4-5. In: Ibidem, pgs. 190-191.