Marabá, 22 de novembro de 2024

A realidade salvadora de Jesus Bom Pastor

06 de maio de 2022   .   

Por Dom Vital Corbellini, Bispo de Marabá – PA.

            O quarto domingo da Páscoa coloca a realidade de Jesus Bom Pastor. A liturgia aprofunda este tema a partir da Palavra de Deus, porque Jesus é o Salvador da humanidade e de todos os seres humanos. A compreensão de Jesus como Bom Pastor está ligada a salvação, porque o seu pastoreio leva à vida verdadeira que é a eterna. Ele a doa por toda a humanidade, de modo que o dom da salvação se realiza na vida de seus seguidores e seguidoras, porque diante dele as pessoas assumem, na liberdade e no amor, o seu seguimento, a sua existência. Nós sigamos os passos de Jesus bom Pastor, sendo pastores que dão a vida assim como Jesus o fez por nós e para todas as pessoas. Vejamos esta doutrina na Patrologia e na Patrística, nos padres da Igreja, os primeiros escritores cristãos.

            O bom Pastor.

            Jesus indica a si mesmo como o bom Pastor. Esta passagem é presente no evangelista São João (Jo 10,11;14) apresentando os traços desta figura muito importante em toda a doutrina salvífica cristã, porque o Pastor entra no rebanho pela porta onde estão as ovelhas, chama-as pelo nome, de modo que tem um conhecimento próprio de suas ovelhas. Ele mesmo as conduz para fora do recinto, caminha diante delas e as ovelhas ouvem a sua voz, seguindo as suas orientações. O conhecimento mútuo do Pastor verdadeiro com as ovelhas tem como fundamento o conhecimento do Filho com o Pai, cuja vida, o bom Pastor a dá pelas ovelhas, bem diferentemente do mercenário que não sabe a caminhada das ovelhas e foge diante do perigo ao chegar o lobo. O bom Pastor dá a vida eterna e ele conduz também as ovelhas que não lhe pertencem ao ovil, de modo que tenha um só rebanho e um só pastor (Jo 10,16)[1].

            O bom Pastor nos padres da Igreja.

            A utilização da imagem do bom Pastor foi muito presente na Patrologia, na literatura patrística, nos padres da Igreja, desde as origens da Igreja. As vezes a aplicação Pastor é inserida no elenco de títulos cristológicos, pois, Cristo Jesus doou a sua vida pelas ovelhas, pelo seu povo. O bom Pastor revela também a divindade de Jesus, como o Salvador da humanidade. Este ponto alude também a necessidade do Senhor como Guia inserida em muitos daqueles que estão desnorteados de seu caminho. O bom qualifica o Pastor que é Jesus e também a igualdade do Filho para com o Pai e do Pai para com o Filho. Cristo Jesus é o Pastor da Igreja e da humanidade[2].

            As ovelhas necessitam do Pastor.

            Clemente, padre de Alexandria, séculos II e III afirmou que as ovelhas necessitam do bom Pastor que é Jesus Cristo. Como os doentes requerem a intervenção médica, da mesma forma cada pessoa humana nesta vida é doente das culpáveis intemperanças, de modo que as ovelhas têm necessidade do Salvador. Ele concede os remédios bons, como também os remédios amargos para que assim se fechem as feridas dos pecados. O temor também se é amargo, é salutar.

            Todas as pessoas têm necessidade do Salvador, daquele que guia para o bem, para o amor. Como o ser humano possui a vontade de tomar a água porque tem sede, da mesma forma a necessidade de se aproximar da fonte da vida, do Pastor que é o Senhor. O fiel seguidor precisa da vida, porque o rebanho necessita do Pastor. A humanidade inteira necessita de Jesus porque sem o seu pastoreio as pessoas não viverão bem e cairão em caminhos tortuosos, sem vida[3].

            O Pastor e pedagogo Senhor.

            Clemente de Alexandria também disse que a suprema sabedoria do santíssimo Pastor e pedagogo, que é Jesus, a Palavra do Pai, serviu-se de uma alegoria, de uma comparação e chamou a si mesmo com o nome de Pastor das ovelhas (Jo 10,2), sendo também o Mestre das ovelhas mais necessitadas. O Senhor conduzirá bem o seu povo, como disse o profeta Ezequiel pois, Ele mesmo apascentará suas ovelhas e as fará repousar. Ele procurará a ovelha perdida, reconduzirá a desgarrada; dará o enfaixe para a ovelha quebrada e fortalecerá a doente e vigiará aquela que estiver bem (Ez 34,15-16).

            A ação salvífica do bom Pastor.

            Clemente de Alexandria ressaltou a importância de deixar-se guiar pela ação de salvação do bom Pastor, que é Jesus. A pessoa é chamada a deixar-se apascentar no caminho do rebanho, ao Mestre que dá copiosamente o seu alimento que é a justiça. O pedagogo é o Pastor que leva a ovelha até a montanha santa, até a Igreja que se eleva e toca os céus (Sl 47,2-3). Ele salva a humanidade, revestindo-a pela túnica da incorruptibilidade (1 Cor 15,53)[4].

            O verdadeiro Pastor serve os outros.

 Clemente de Alexandria também aprofundou o ponto que o Senhor Jesus, como verdadeiro Pastor veio para servir e não para ser servido. Ele doou a sua vida em resgate por muitos (Mt 20,28). Só o bom Pastor, se comporta deste modo (Jo 10,11), porque ele se preocupa com a vida de suas ovelhas, e por isso ele está sempre disposto a servir e dar a vida. Ele, doador generoso, ofereceu para toda a humanidade aquilo que ele possuía de mais precioso, que é a sua alma, a sua vida, a pessoa de Jesus Cristo para todas as pessoas (Jo 15,13)[5].

            A missão do bom Pastor.

            O autor Pseudo-Macário, um monge do Egito do século IV, disse que Jesus veio entre os seres humanos para converter e transformar a natureza humana, regando por meio da união com o Espírito divino a alma, sobrecarregada da mancha do pecado. O Senhor doou ao ser humano uma mente nova, uma alma nova, olhos novos, orelhas novas, uma linguagem nova, humana e espiritual e para tornar a todos, homens e mulheres novos, animados pela fé nele. Ele concederá odres novos, significando a sua unção com a luz da sua sabedoria e derramando nos seres humanos, o vinho novo que é o Espírito Santo[6].

            O bom Pastor que cuida de todas as pessoas

            O monge, Pseudo-Macário ainda colocou o dado que o bom Pastor curou a ovelha doente e manca para protegê-la dos lobos. Cristo, o verdadeiro Pastor com a sua vinda, converteu a ovelha perdida e doente, isto é o ser humano, purificando-o da lepra do pecado. Outrora nem os sacerdotes, nem os levitas, nem os doutores restauraram a saúde da alma com as ofertas e o dom dos sacrifícios com o derramamento de sangue conseguiram a restauração da vida humana. Jesus como verdadeiro médico curou a ovelha doente e como o bom Pastor doou a sua vida, pelas suas ovelhas (Jo 10,11), sendo ele o único capaz de curar qualquer doença e incapacidade da alma. O monge ainda disse que o bom Pastor cura a ovelha doente de modo que só Ele realizou essas coisas. A ovelha por sua vez não era capaz de curar uma outra semelhante a ela. E a ovelha racional, que era o ser humano, não obteve a saúde, senão pelo bom Pastor, porque este fez a sua entrada na Igreja celeste, a vida eterna com o Senhor[7].

            O pastor tenha compaixão.

            São Gregório Magno, papa, séculos VI e VII, falou que o pastor, no caso o ministro ordenado, tenha compaixão para cada pessoa, uma contemplação que o desapegue da terra mais que todos os outros. Ele carregará a enfermidade dos outros, pela altura da sua contemplação; ele se elevará acima de si mesmo, aspirando aos bens invisíveis[8]. Como Jesus ele dará a vida pelo seu povo.

            O bom Pastor, Jesus fortalece a caminhada de cada fiel, de cada pessoa que seguem, dando-lhe a saúde do corpo e da alma, a vida humana e um dia a eterna. É preciso seguir os passos do pastoreio realizados por Jesus, porque Jesus ensina a importância de estar com ele, para pensar e agir bem junto à comunidade eclesial, com as pessoas sobretudo, com os pobres, para ter a vida eterna. O seu pastoreio resume-se na salvação de toda e qualquer pessoa, fazendo-a redimida. O bom Pastor salva o mundo, o ser humano.

[1] Cfr. A. Polastri. Pastore (Il buon). In: Nuovo Dizionario Patristico e di Antichità Cristiane, diretto da Angelo Di Berardino, P-Z. Marietti, Genova, 2008, p. 3947.

[2] Cfr. Idem, pgs. 3947-3948.

[3] Cfr. Clemente Alessandrino. Il Pedagogo, 1, 83-86. In: La teologia dei padri, v. 2. Città Nuova Editrice, Roma, 1982, pg. 101.

[4] Cfr. Idem, pg. 101.

[5] Cfr. Idem, pg. 101.

[6] Cfr. Pseudo-Macario. Omelie Spirituali, 44,1-4. In: Idem, pg. 103.

[7] Cfr. Idem, pg. 104.

[8] Cfr. Gregório Magno. Regra Pastoral, II, 5. São Paulo, Paulus, 2010, pg. 71.

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