Por Dom Vital Corbellini, Bispo de Marabá – PA.
Em setembro, a Igreja no Brasil, tem presente a comemoração do mês bíblico. São cinqüenta anos de iluminação da Palavra de Deus, onde ocorre a meditação de algum livro seja do AT, seja do NT. Pata todos, é o momento de realizar uma leitura aprofundada para que ela seja vivida no mundo de hoje, com as suas dificuldades e as suas esperanças, e em nossa realidade. Deus se revelou pelas Sagradas Escrituras. Mas é, sobretudo, em Jesus Cristo, a realização das promessas do Antigo Testamento, dando-lhe vida e vigor novos, dos quais exige de nossa parte, conversão de vida e compromisso de amor. A seguir, dar-se-á, uma visão de como que os padres da Igreja colocaram a Sagrada Escritura, o Antigo Testamento, que se cumpriu no Novo Testamento.
Os apóstolos testemunharam os dois Testamentos.
Santo Ireneu de Lião, bispo do século II afirmou que todos os apóstolos ensinaram a existência de dois Testamentos para dois povos, da Antiga Aliança e da Nova Aliança, mas que foi um só e único Deus que os deu para a utilidade dos seres humanos na medida em que acreditaram em Deus, pelo seu Filho, Jesus Cristo. Não foi inútil aquilo que foi elaborado no primeiro Testamento, ou seja, o Antigo Testamento, o qual se deu ao serviço de Deus e para o bem próprio do ser humano, sendo um símbolo das coisas celestes, contendo a profecia do futuro, para que o ser humano aprendesse que Deus conhece todo o futuro[1].
Jesus Cristo, a verdade em sua plenitude.
Santo Ireneu teve presente a tradição apostólica na qual perdurava nos tempos do bispo de Lião. Os apóstolos expuseram a doutrina sobre Deus, demonstrando que nosso Senhor Jesus Cristo é a Verdade em sua plenitude (cf. Jo 14,6) e que nele não há falsidade. Santo Irineu afirmou que foi Davi quem predissesse o nascimento do Senhor de uma Virgem e da sua ressurreição dos mortos. Os apóstolos foram discípulos da Verdade, que é Jesus Cristo a respeito das Sagradas Escrituras[2].
A realização das profecias.
Santo Irineu ainda disse que o Verbo é de Deus, e é também verdadeiro homem, Conselheiro maravilhoso, Deus-forte (cfr. Is 9,5), pois ele chamou com a sua ressurreição[3], o ser humano à comunhão divina, para participar da imortalidade e da incorruptibilidade com Deus[4]. Ele foi anunciado por Moisés e pelos profetas, do Deus altíssimo e onipotente, Pai do universo, origem de tudo, que veio à Judéia, gerado por Maria, Jesus, o Ungido de Deus, que revelou a si mesmo como o que foi predito pelos profetas[5].
A antiguidade do nome de cristãos.
Eusébio de Cesaréia, bispo na Palestina, no século IV, afirmou que o nome de cristãos era uma prova da antiguidade do cristianismo. Como de fato era dado o nome dos seguidores do Senhor, comprovou que o gênero e o comportamento de vida, segundo os ensinamentos da piedade não eram recentemente inventados por eles. O povo dos hebreus foi responsável pela sua antiguidade e era conhecido, por pessoas eminentes pela piedade onde o Senhor preparou um povo para a vinda do Messias. O bispo da Palestina disse que o próprio Cristo de Deus, foi visto por Abraão (cfr. Gn 18,1), profetizado por Isaac (cfr. Gn 26,2), falou a Israel, Jacó (cfr. Gn 35,1), conversou com Moisés e os posteriores profetas. A religião dos amigos de Deus foi proclamada pela presença de Cristo Jesus juntamente com os seus discípulos na divulgação de sua doutrina e ação pelo mundo afora[6].
A salvação vem de Cristo pelos justos do AT.
São Gregório de Nazianzo, bispo de Constantinopla, no século IV, falou que a salvação dos justos do Antigo Testamento derivou de Cristo Jesus. Houve o exemplo dos macabeus que sofreram o martírio antes da paixão de Cristo, por causa da lei dos pais. Para São Gregório de Nazianzo era clara a realidade que nenhuma das pessoas justas alcançou a perfeição antes da vinda do Messias, pois só a alcançaram pela fé em Cristo Jesus. O Logos, Cristo, foi abertamente anunciado e também no seu tempo; mas foi conhecido pelas almas puras, como é claro por muitos que antes foram honrados. Eles deviam ser louvados porque eles viveram conforme a cruz de Cristo dos quais deram a vida[7].
O cumprimento do AT em Cristo Jesus.
Santo Agostinho, bispo de Hipona, nos séculos IV e V, disse que cinco foram às idades do mundo antes da vinda do Senhor Jesus. Depois ocorreu a sexta idade, da presença do Salvador da humanidade, pela qual a mente humana fosse renovada à imagem de Deus (cf. Cl 3,10), como no sexto dia, o ser humano foi feito à imagem de Deus (cfr. Gn 1,26-27). A lei se cumpriu (cfr. Rm 13,10) já que todas as coisas prescritas foram assumidas, não por ambição das coisas temporais, mas por amor Daquele que as prescreveu. Deus enviou o seu único Filho (cfr. 1 Jo 4,19) que se fez homem, para a redenção de todos. Em Cristo Jesus se manifestou o Novo Testamento proveniente do Antigo Testamento, sendo nele renovado, pela graça, o ser humano em vista da vida eterna. Ele assumiu a carne humana, fez-se pobre, aquele a quem tudo pertence e por meio de quem tudo foi criado (cfr. Cl 1,16), sofreu a morte na cruz (cfr. Mt 27,50), mas também ele ressuscitou para nunca mais morrer (cfr. Rm 6,9)[8].
O Antigo Testamento se cumpriu no Novo Testamento.
São João Crisóstomo, bispo de Constantinopla, nos séculos IV e V, afirmou que Cristo deu valor à lei antiga, porque nele se cumpriu as promessas do Antigo Testamento. Ele demonstrou que são da mesma descendência, que tem a mesma origem. A lei não salva mais após a vinda de Cristo, porque é só em Cristo que há a salvação. No entanto todos aquelas pessoas que viveram fieis à lei, antes de Cristo, se salvarão em unidade com Cristo. Pela presença do Espírito Santo, a nova lei colocou promessas bem mais altas que a antiga lei, de modo que Deus deu a todos os seus seguidores, bens maiores. Ele, em Cristo, prometeu o céu mesmo, os bens celestes, a dignidade de serem filhos adotivos do Pai, irmãos e irmãs do Filho Unigênito, participantes da sua glória e do seu reino de modo que o Antigo Testamento se cumpriu no Novo Testamento pela presença de Jesus Cristo, o Filho de Deus na carne e na glória[9].
A palavra de Deus tem sempre a sua atualidade, porque ela leva a pessoa à conversão de vida. É a presença de Deus no seu Filho, pelo Espírito Santo, Deus Uno e Trino que nos chama para a vida eterna. Neste mês que em que refletimos a Carta de São Paulo aos Gálatas, vivamo-la em nossa realidade, na qual Cristo derrubou o muro da separação, criando um ser humano novo, mulheres e homens renovados, a serviço do próximo e de Deus.
[1] Cfr. Irineu de Lião, IV, 32,2. Paulus, SP, 1995, pg. 47.
[2] Cfr. Idem, III, 5,1, pgs. 254-255.
[3] Cfr. Irineu de Lyon, Demonstração da pregação apostólica, 40. Paulus, SP, 2014, pg. 100.
[4] Cfr. Idem, V, 13,3, pg. 551.
[5] Cfr. Idem, Demonstração da pregação apostólica, pg. 40.
[6] Cfr. Eusébio de Cesaréia. História Eclesiástica, I, 4, 4-15. Paulus, SP, 2000, pgs. 44-47.
[7] Cfr. Gregorio di Nazianzo. Discorso in lode dei Macabei, 115,1-2. In: La teologia dei padri, v. 4. Città Nuova Editrice, Roma, 1982, pg. 197.
[8] Cfr. Santo Agostinho. Primeira Catequese aos não cristãos, XXII, 39-40. Paulus, SP 2013, pgs. 124-128.
[9] Cfr. Giovanni Crisostomo, Commento al Vangelo di san Matteo, 16,4-5. In: La teologia dei padri, v. 4, pgs. 190-191.