Marabá, 22 de novembro de 2024

A vivência do Tríduo Pascal e da Páscoa do Senhor

13 de abril de 2022   .   

Foto: flickr

Por Dom Vital Corbellini, Bispo de Marabá – PA

O tríduo pascal se constitui o centro de toda a vida do Senhor pela salvação da humanidade, e também da vida e da liturgia cristã. Tríduo vem do latim Triduum, período de três dias, ciclo de orações ou de ritos concluídos no espaço de três dias[1]. O Tríduo pascal tem significado de três dias, muitos intensos dados pelo Senhor a todas as pessoas. Ele é muito importante para os discípulos, missionários, discípulas, missionárias de Jesus Cristo e para a sua Igreja. O conhecimento de cada dia do tríduo pascal é fundamental em vista do mistério celebrado em nossas vidas. O amor de Deus em Jesus Cristo ocorreu na objetividade das coisas, pois ele amou a humanidade. Nós somos convidados a passar da paixão, morte à ressurreição de Jesus. A Páscoa seja uma oportunidade de paz entre os povos e nações pela paz que o Ressuscitado, Jesus Cristo traz para todos.

Todas as vezes que celebramos a eucaristia nós fazemos memória do Senhor que passou a sua vida em doação continua aos seres humanos, pelo seu corpo e sangue. A sua memória seja vivida na humanidade e em cada de nós, porque nós necessitamos nos unir sempre mais a Cristo, caminho, verdade e vida (Jo 14,6). É a memória de uma pessoa que marcou a todos no sentido de redenção, de amor.

O tríduo possibilite uma conversão de vida em todos os seus seguidores e seguidoras. Cristo Jesus nos amou até o fim e ressuscitou dos mortos. Se tudo isso é celebrado nas missas, ele foi também visto na vida do Senhor pelo qual anunciou por diversas vezes que deveria passar pela paixão, pela calúnia, pela condenação, pela morte, mas que no terceiro dia ressuscitaria dos mortos (Lc 9,22). A seguir nós faremos uma análise do mistério pascal em nossas vidas de seguidoras e de seguidores de Cristo Jesus. É preciso redescobrir sempre mais a espiritualidade contida nas celebrações para que o mistério fortaleça a vida da Igreja e de todos os seguidores do Senhor Jesus Cristo.

            Quinta-feira santa.

            É o primeiro dia do Tríduo pascal. Nas catedrais do mundo afora ou em outras ocasiões, na parte da manhã, a Igreja convoca os cristãos, católicos e católicas para a missa do Crisma, a sua consagração, a benção dos óleos dos enfermos, dos catecúmenos. A renovação das promessas sacerdotais está dentro desta liturgia e também as instituições da eucaristia e do sacerdócio como graças do Senhor e como responsabilidade humana iluminam a liturgia da missa do crisma.

            Na parte da noite, deste dia haverá a missa da ceia do Senhor e do lava-pés. Estão bem presentes as memórias da páscoa judaica, que se constituía uma passagem da escravidão para a terra prometida, mas, sobretudo a páscoa cristã, que é a passagem da paixão e morte para a ressurreição do Senhor. A instituição da eucaristia está bem presente na Carta de São Paulo aos Coríntios. Jesus tomou o pão e, depois de dar graças disse: ‘tomai e comei’. Com o cálice com vinho disse: ‘tomai e bebei, fazei isto em memória de mim’, do Senhor (1 Cor 11, 23-26). O evangelista João não colocou as palavras da última ceia, no pão e no vinho doados para todos os seres humanos pelo Senhor Jesus, mas sim ele mencionou o lava-pés. O lava-pés aludiu à atitude de Jesus que sendo Mestre e Senhor ensinou a todos a importância do serviço, de se lavar os pés uns dos outros, de buscar uma vida de pessoas serviçais, sempre prontos a ajudar os outros, para que todas as pessoas cumpram uma missão de servir, diante do povo e diante de Deus.

            São Melitão de Sardes, Bispo, perto Esmirna, século II falou que o Cordeiro imolado arrebatou as pessoas da morte para a vida. Ele veio de Deus para a terra por causa do ser humano, revestindo-se da humanidade no seio da Virgem Maria. Ele destruiu a morte pela sua morte: ele foi levado como Cordeiro e morto como ovelha. Ele libertou a todos da morte para a luz, da morte para a vida, fazendo de seus discípulos um sacerdócio novo, um povo novo. Ele é de fato o Cordeiro imolado, mas ressuscitou dos mortos. Ele reergueu o ser humano do fundo do sepulcro[2].

            Sexta-feira santa.

            É o segundo dia do tríduo pascal. É o dia da cruz redentora. As atenções são voltadas à paixão, morte do Senhor pela salvação da humanidade. O seu sofrimento é um sofrimento redentor, para redimir o ser humano do pecado e da morte. É um dia sem os sacramentos. Deste modo no dia em que as atenções estão voltadas para o sacrifício de Cristo na cruz, a Liturgia não celebra a missa, mas é dada uma evocação da morte do Senhor. É um dia de silêncio, de recolhimento, de jejum, de abstinência de carne.

            As palavras do Mestre ganham sentido pela sua integridade, de que ele amou a todos até o fim (Jo 13,), não tendo um espaço para ele mesmo, mas ele nos amou de fato até o fim. A liturgia coloca três partes importantes para serem celebradas; a liturgia da palavra, adoração da cruz e a santa comunhão, a eucaristia, pois as hóstias consagradas na quinta-feira santa serão consumidas neste dia, pelos fieis.

            Orígenes, padre de Alexandria, século II e III, afirmou que Jesus assumiu a Paixão com o dado do Amor. Ele veio sobre a terra movido, pela compaixão pelo gênero humano. Ora, se ele não sofresse não teria vindo para viver a vida dos seres humanos. Ele sofreu a paixão do amor de uma forma infinita por causa da natureza humana, dando a redenção humana para todos[3].

            Tertuliano, no livro (De An. 43) afirmou o nascimento da Igreja pelo lado aberto do Senhor, porque assim como Adão foi figura de Cristo, o sono de Adão prefigurava a morte de Cristo, que devia dormir o sono da morte, de modo que a ferida aberta no seu lado prefigura a Igreja, a verdadeira mãe dos viventes[4].

Já São Crisóstomo, bispo de Constantinopla, séculos IV e V, falou do poder do sangue de Cristo, que purificou os pecados, é salvador. O sangue do cordeiro no AT, na noite da passagem da escravidão do Egito, foi figura do sangue de Cristo Senhor. Em Cristo é dado o sangue verdadeiro. Ele jorrou da própria cruz e o lado do Senhor foi sua origem. Morto o Senhor, um soldado feriu-lhe o lado e onde jorrou água e sangue. A água símbolo do batismo; o sangue, símbolo do mistério. Deste lado nasceu a Igreja santa pelo banho da regeneração e renovação no Espírito, isto é pelo batismo e pelos mistérios que brotam do lado traspassado[5].

Sábado santo.

É o terceiro dia do Tríduo Pascal. Jesus desceu à mansão dos mortos e triunfou sobre a morte. É o dia da vigília pascal, na espera da ressurreição do Senhor Jesus Cristo. A comemoração da Ressurreição do Cristo ocorre desde a mais remota memória da Tradição, porque na noite de sábado para domingo, sendo este o primeiro dia da semana, o Senhor já não está mais no sepulcro, mas ele está vivo e ressuscitou dos mortos (Mt 28, 6-7; Jo 20,1-10). A Tradição cristã associou a noite da Ressurreição à noite da Páscoa descrita em Ex 12,42, uma noite de vigília em honra do Senhor. Cristo que morreu, mas sua morte é como sono do qual despertará na manhã da Páscoa da ressurreição.

A liturgia é bem longa, com um significado profundo, mas que ela tem presente à páscoa do Senhor, a sua passagem da morte para a vida. Ela contém quatro partes, que são a liturgia da luz, da palavra de Deus, batismal e eucarística. É uma liturgia que fala por si mesma, na qual nós devemos beber da fonte, que é o mistério pascal do Senhor Jesus Cristo.

Nesta noite, a Igreja primitiva realizava os sacramentos da iniciação à vida cristã numa única cerimônia: o batismo dos catecúmenos adultos que desciam à água como sinal de morte e sepultura e emergiam da fonte para significar a ressurreição, eram depois crismados pelo Bispo e após um período de três anos ou um certo tempo de preparação recebiam pela primeira vez a eucaristia e eram integrados à comunidade.

Nós temos um depoimento muito bonito que veio da Patrologia, Patrística, a respeito do sábado santo, conhecida por uma antiga homilia, século IV, no Oriente. Ela diz que hoje está acontecendo grande silêncio, solidão; O Rei está dormindo. O Deus feito homem adormeceu e acordou os que dormiam há séculos. Deus morreu na carne e despertou a mansão dos mortos. Ele vai à procura de nosso primeiro pai, a ovelha perdida; Vai ao encontro de Adão e Eva cativos, agora libertos dos sofrimentos; Aproximou-se deles empunhando a cruz vitoriosa[6].

Ele disse: “Acorda, tu que dormes, levanta-te dentre os mortos e Cristo te iluminará. Eu sou teu Deus que por tua causa me tornei teu filho; saí! Acorda, tu que dormes, porque não te criei para permaneceres acorrentado na mansão dos mortos; Levanta-te, obra de minhas mãos; Levanta-te, ó minha imagem, tu que foste criado à minha semelhança; levanta-te, saiamos daqui”[7].

Domingo da Páscoa.

Neste domingo, comemoramos a Páscoa do Senhor Jesus Cristo. Ela era considerada desde o inicio a grande festa, que norteava toda a vida cristã. Esta é a mais importante do ano litúrgico, aquela que dá sentido pleno. Celebramos a ressurreição de Jesus. É uma festa de luz; o Senhor ressuscitado nos ilumina, coloca em nossos corações uma imensa alegria, uma esperança, e nos enche também de amor. Nós celebramos a eucaristia do Domingo de Páscoa, na qual a mensagem central é: Cristo ressuscitou dos mortos. É uma celebração ligada aquela de ontem à noite. Cristo não estava mais no sepulcro, mas Ele está vivo e caminha com os seus discípulos e está no meio de nós. Ele é o Eterno vivente, pois é junto do Pai e com o Espírito Santo e está junto de seu povo reunido, que vive a fé, a esperança a e caridade.

São Melitão de Sardes, Bispo, perto Esmirna, século II falou da importância da vivência da Páscoa no seguimento a Cristo e à sua Igreja. Ele dizia que todos são chamados a viver o mistério pascal, novo e antigo, eterno e temporal, mortal e imortal  o mistério pascal. Antigo segundo a Lei; novo, segundo o Verbo. Temporal pela figura, eterno pela graça; corruptível pela imolação do cordeiro, incorruptível pela vida do Senhor. Mortal em sua sepultura na terra, imortal na ressurreição dentre os mortos. Corruptível é o Cordeiro, incorruptível o Senhor, que imolado qual cordeiro, ressuscitou como Deus; A imolação da ovelha, a celebração da Páscoa e a Lei escrita atingiram seu fim em Cristo Jesus[8].

A vivência do Tríduo Pascal é oportunidade para um crescimento espiritual, familiar, comunitário e social em Cristo Jesus e com a sua Igreja. Estes dias sejam de muita meditação, para que a liturgia leve a uma vida de unidade com o Senhor que nos amou até o fim e ressuscitou dos mortos, de modo que a nossa vida tem sentido, na luta pela vida, pela paz e pelo amor. Cristo Jesus passou da morte para a vida; ele caminha conosco. Rezemos pela paz em nosso meio e também para que cessem as guerras pelo mundo afora. Nós também somos chamados a fazer a nossa Páscoa diária buscando uma vida de conversão e um dia será para sempre com o Deus Uno e Trino.

[1] Cfr. Trìduo. In: Il vocabolario treccani, Il Conciso. Milano, Trento, 1998, pg. 1821.

[2] Cfr. Da Homilia sobre a Páscoa, de Melito, Bispo de Sardes (NN 65-71; SC 123, 95-101). In: Liturgia das Horas. São Paulo, Edições Paulinas, 1987, pgs. 307-308.

[3] Cfr. Origene. Omelie su Ezechiele 6,6. In: Nuove Letture dei Giorni. Magnano (BI), Edizioni Qiqajon, 2010, pg. 140.

[4]  Cfr. Johannes Quasten, Patrologia. I primi due secoli (II -III). Marietti, Casale, 1980, pg. 567.

[5] Cfr. Das Catequeses de São João Crisóstomo (Cat. 3,13-19; SC 50, 174-177). In: Liturgia das Horas, pgs. 310-

[6] Cfr. De antiga Homilia no grande Sábado Santo. (PG 43, A3. A39. A51. A62-A63). In: Idem, pgs. 313-314.

[7] Cfr. Idem, pg. 314.

[8] Cfr. Da Homilia sobre a Páscoa, de Melito, bispo de Sardes (Cap.2-7, 100-103. SC 123, 60-64, 120-123). In: Idem, pgs. 324.

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