Por Dom Vital Corbellini, Bispo de Marabá – PA
O advento é o inicio de um novo tempo na vida litúrgica da Igreja do Senhor. Ele é permeado de muita alegria e amor, porque ele aponta para o santo Natal, para o nascimento de Jesus Cristo na realidade humana. “E a Palavra se fez carne e veio morar entre nós” (Jo 1,14). O advento é palavra proveniente do latim: adventus-us, chegada, chegar, esperar pelo advento é dado por um período de paz; são quatro semanas de preparação ao Natal[1]. Vivamos bem este período significativo na vida familiar, eclesial e social. A seguir vejamos como a Igreja antiga fez a sua preparação em relação ao Natal, pelo tempo do advento.
A preparação para o nascimento do menino Jesus.
A Igreja antiga convocava os fieis para se preparar para a vinda do menino Jesus ao mundo. Com a fixação da festa da Páscoa, um tempo mais tarde ocorreu com o Natal, a comunidade eclesial fixou um tempo de preparação para a vinda do Senhor, o advento que iniciou nas províncias da Gália, da Espanha, de, pois em Roma e também no Oriente[2]. No Ordo Romanus XV, do século VIII, espécie de resumo de prescrições litúrgicas, ressaltou-se que o tempo do advento deveria iniciar nos primeiros dias dezembro, em preparação para o santo natal[3].
A Igreja antiga ressaltava a importância da vida que Deus trouxe à humanidade através de seu Filho Jesus Cristo. Maria foi percebida como a mulher que colaborou com o plano salvífico do Pai, em vista da salvação da humanidade assumida pelo Senhor Jesus Cristo. O advento se constituiu como o tempo propício de louvor e de esperança pela vinda do Messias ao mundo, mensagem evangélica para todos os tempos.
A realidade do nascimento do Messias.
As representações antigas encontradas nas catacumbas e outros lugares, em vista do nascimento de Jesus colocaram a pobreza no recém-nascido, a realeza do Senhor. Os autores cristãos percebiam nas profecias do AT a alusão à encarnação do Verbo, ao nascimento do Messias, por uma Virgem, de modo que tudo isso aludiam à encarnação do Verbo, sublinhando à realidade do seu itinerário terreno e o anúncio do advento do Messias aos pastores, isto é junto ao povo hebreu[4].
Maria, José e o Menino Jesus.
Nessas representações da Igreja antiga apareciam também as figuras de Maria, José e o menino Jesus. Em outras figuras apareciam na natividade em preparação ao santo Natal, o menino em faixas na manjedoura, o boi, o burro, apresentações lembradas na profecia de Isaias(cfr. Is 1,3). Com o tempo, as pessoas colocaram também nessas imagens a adoração dos reis magos. As apresentações deram-se em relação à Maria e a José, ajoelhados junto ao menino Jesus na manjedoura[5]. Todas essas coisas foram importantes no tempo do advento para os fiéis prepararem o mistério da salvação, assumido pelo Filho de Deus, Jesus Cristo na realidade humana.
O tempo de espera no Senhor.
São Leão Magno, Papa do século V ressaltou num sermão de Natal o tempo da espera do Senhor, que foi o tempo do advento, e a qual se concretizou no Natal. Os tempos pré-ordenados se cumpriram para a redenção dos seres humanos, Jesus Cristo, Filho de Deus, o qual penetrou na realidade humana, descendo da morada celeste, sem deixar a glória do Pai, vindo ao mundo por um novo nascimento. O Senhor Deus impassível, não se julgou indigno assumir a humanidade passível, imortal, mas ele submeteu-se às leis da morte para salvar a todos[6].
A vinda do Senhor.
São Cirilo de Jerusalém, bispo do século IV afirmou a alegria pela vinda de Cristo, não apenas a primeira, mas também a segunda, a gloriosa, pois se a primeira foi revestida do ponto de vista de sofrimento, pela humanidade, a segunda manifestará a coroa da realeza divina. Se a primeira vinda ele foi envolto em faixas, e reclinado num presépio, na segunda será revestida pela luz. Se a primeira ele teve que suportar a cruz, na segunda virá cheio de glória, cercado pelos anjos[7]. Desta forma a advento nos ajuda a viver a dimensão da vinda do Senhor que se fez carne para a nossa salvação.
A Palavra do Pai se fez pessoa humana.
São Gregório de Nazianzo, bispo de Constantinopla, século IV afirmou que o Filho de Deus, que existe desde toda a eternidade, incorpóreo, a luz nascida da luz, a fonte da vida e da imortalidade, a Palavra do Pai veio em ajuda à criatura feita à sua imagem e por amor do ser humano se fez pessoa humana, gente, homem. Ele assumiu tudo o que é humano, exceto o pecado. O bispo também ressaltava que o Senhor que enriqueceu os outros, tornou-se pobre, aceitando a pobreza da condição humana para que a mesma recebesse os tesouros de sua divindade. Aquele no qual possui tudo em plenitude aniquilou-se a si mesmo; despojou-se de sua glória por um tempo para que as pessoas participassem de sua plenitude[8].
A necessidade de vigiar.
Santo Efrém, Diácono do século IV colocou a necessidade, no tempo da espera, no caso do advento, de vigiar, do latim vigilare, cujo significado é alerta, estar atento, fazer muita atenção[9], porque este tempo é especial e exige a vigilância. Diante da interrogação dos discípulos para saber a hora de sua vinda, o Senhor ocultou a todos a hora, para que todos os seus seguidores ficassem vigilantes. O Diácono também afirmou que se o Senhor tivesse revelado o tempo de sua vinda, esta deixaria de ter interesse e poderia não mais ser desejada pelos povos das épocas em quem se manifestará. Se o Senhor disse que viria, no entanto ele não declarou o momento de modo que as gerações e todos os séculos o esperam de uma forma ardente e alegre[10].
O advento é um tempo especial que nos ajuda a preparar bem a vinda do Messias, Jesus Cristo em nossa realidade. Ele já veio de uma forma humana e agora Ele vem sempre em nosso meio para nos encorajar para sermos discípulos, missionários em saída, para torná-lo conhecido e amado pelos povos. O advento é tempo de alegria, pois o nascimento de Cristo trará vida nova para toda a humanidade, pois o Filho de Deus se tornou gente, carne e veio habitar no meio de nós (cfr. Jo 1,14). Nós somos chamados a viver o advento como tempo de aumento de nossa fé, esperança e caridade.
[1] Cfr. Avvento. In: Il vocabolario treccani, Il Conciso. Milano, Trento, 1998, pg.157.
[2] Cfr. Karl Suso Frank. Manuale di Storia della Chiesa Antica. Libreria Editrice Vaticana, Città del Vaticano, 2000, pg. 385.
[3] Cfr. Ordo Romanus XV, 1. In: Antologia Litúrgica, Textos litúrgicos, patrísticos e canónicos do primeiro milénio. Gráfica de Coimbra, Lda. Fátima, 2003, pg. 1407.
[4] Cfr. M. Marinone. Natività. In: Nuovo Dizionario Patristico e di Antichità Cristiane, diretto da Angelo Di Berardino, F-O. Marietti, Genova, 2007, pg. 3424.
[5] Cfr.Idem, pgs. 3424-3425.
[6] Cfr. Leão Magno. XXII Sermão. Segundo Sermão do Natal do Senhor, 2. Paulus, São Paulo, 1996, pgs. 37-38.
[7] Cfr. Das Catequeses de São Cirilo de Jerusalém. As duas vindas de Cristo, Cat. 15, 1-3; PG 33, 870-874. In: Liturgia das Horas, I. Edições Vozes, Paulinas, Paulus, Editora Ave-Maria, 1999, pg. 113.
[8] Cfr. Dos sermões de São Gregório de Nazianzo. In: Idem, pgs. 130-131.
[9] Cfr. Vigilare. In: Il vocabolario treccani, Il Conciso. Idem, pg. 1897.
[10][10] Cfr. Do Comentário sobre o Diatéssaron, de Santo Efrém, Diácono, 18, 15-17; SCh 121, 325-328. In: Idem, pgs. 144-145.