Marabá, 27 de abril de 2024

O martírio de Perpétua e Felicidade, doação e amor

26 de outubro de 2020   .    Notícias da Igreja

O martírio de Perpétua e Felicidade, doação e amor

Por Dom Vital Corbellini, Bispo de Marabá – PA.

            A tradição literária dos santos e santas mártires fez com que o martírio de Perpétua e Felicidade fosse conhecido e chegasse até nós, de modo que faremos a seguir, uma análise da forma como ocorreu o martírio delas, em Cartago, norte africano, pelos anos 203. Uma vez que Tertuliano sabia grego e latim, o relato do martírio dessas duas mulheres e outras pessoas que as acompanharam, certamente foi escrito por Ele, pois o documento foi elaborado nas línguas grega e latina[1]. O seguimento a Cristo Jesus exige a doação para assim Deus Uno e Trino ser glorificado pelas ações que realizamos no mundo de hoje, na família, na comunidade e na sociedade.

            Honra a Deus e conforto para o ser humano

            O autor, Tertuliano colocou desde o inicio que a leitura dos fatos extraordinários dos mártires deveria causar a honra devida a Deus e o ânimo para as pessoas. O Espírito Santo virá para intervir nos tempos para tornar as pessoas novas como o profeta falou no qual o Espírito será derramado sobre os servos, servas, jovens e velhos[2]. Todas aquelas coisas foram percebidas nesta narração e após ter ouvido a sua leitura, a pessoa entrasse em comunhão com os santos mártires e através deles, com o Senhor nosso Jesus Cristo, ao qual é esplendor e glória nos séculos[3]. Foram presos alguns jovens catecúmenos Revogado, Felicidade, Secundolo e com eles Vibia Perpétua, de família boa, instruída, casada. Tinha os seus familiares e tinha um bebê que ainda amamentava nos seios maternos[4]. Mas enquanto essa estava nas mãos dos guardas que os prenderam, o pai de Perpétua desejava que a sua filha renegasse a sua fé, devido a sua situação de mãe de um filho pequeno e do afeto para com o seu pai. Mas Perpétua argumentou que não queria renegar o seu nome de cristã[5]. O pai não gostou da resposta da filha Perpétua, mas a deixou em paz, fazendo com que a filha desse graças ao Senhor, se sentido mais aliviada da situação. Naqueles dias foram batizados os catecúmenos e o Espírito Santo fez compreender que eles deveriam resistir às dores do corpo, sendo essas também fechadas na prisão com trevas bem profundas[6].

            Lá, era insuportável o calor pela aglomeração das pessoas, e havia a preocupação pelo filho de Perpétua, do qual segundo o depoimento dela falava com muita dor e esperança. Dois diáconos puderam intervir para tirá-los daquela situação, e colocá-los em celas mais ventiladas. Perpétua amamentou o seu filho que estava quase morto de fome[7]. Após alguns dias as autoridades solicitaram para Perpétua para que o

[1] Cfr. Cfr. Johannes Quasten, Patrologia. I primi due secoli (II -III). Marietti, Casale, 1980, pg. 490.

[2] Cfr. Jl 2,28-9. Passio Perputuae et Felicitatis. Passione di Perpetua e Felicita. In: Atti e Passioni dei martiri, a cura di A. A. R. Bastiansen, A. Hilhort, G. A. A. Kortekaas, A. P. Orbán, M. M. Van Assendelft, Fondazione Lorenzo Valla, Arnoldo Mondadori Editore, Verona, 1995, 1,4 pg. 115.

[3] Cfr. Passio Perpetuae et Felicitatis. Passione di Perpetua e Felicita, 1,6, pg. 117.

[4] Cfr. Idem, 2,2, pg. 117.

[5] Cfr. Idem, 3,2. pg. 119.

[6] Cfr. Idem, 3,5. pg. 119.

[7] Cfr. Ibidem, 3,8, pg. 119.

bebê não ficasse com ela, mas com os seus familiares e parentes. Ela, no entanto permaneceu no cárcere e sentiu-se mais aliviada de modo que ofereceu a sua dor e sacrifício pelo filho[1]. Um irmão dela tentou persuadi-la para que não fosse para o martírio, mas ela recusou o convite e entendeu que seria o martírio o próximo passo de sua vida[2].

            A insistência de seus familiares

            Como eles e elas seriam interrogados pelas autoridades, o pai de Perpétua insistia para que ela desistisse de ir ao martírio, tivesse piedade dele, pois a preferia aos seus irmãos, mas ele não queria dela, fosse exposto à gozação. Ele pedia que recusasse o martírio, para que ela pensasse na sua mãe, nos seus irmãos e no filho pequeno que dificilmente iria sobreviver[3]. Mas Perpétua ficou firme na sua decisão do martírio, na qual o seu pai considerava a sua filha não mais como filha, mas senhora. Perpétua disse para o seu pai que no tribunal tudo ocorreria como Deus desejaria dela. Ela estava com certeza de realizar, não a sua vontade, mas a vontade de Deus. O pai dela saiu muito aflito.

            Após alguns dias foram todos levados ao palco para as interrogações de modo que o pai de Perpétua gritou para que ela recusasse ser cristã. Ela disse que era cristã e não negou o seu testemunho diante das autoridades. Como ela queria ainda dar de mamar ao seu filho, no entanto o pai recusou este pedido, mas teve o milagre que o filho não necessitasse mais de mamar pelos seios maternos[4].

            O autor, Tertuliano, da Paixão de Perpétua e de Felicidade colocou também mais uma visita da parte do pai de Perpétua na qual suplicava sempre para que a filha desistisse do martírio e afirmava que não era feliz pela sua idade avançada, por ser idoso. Perpétua manteve-se firme na decisão de dar a vida pelo Senhor e provou grande aflição pela sua infeliz idade avançada de seu pai[5].

            Perpétua teve um sonho na qual viu se aproximar dela um ser humano vestido de branco que lhe disse que iria combater com ela na arena, mas depois desapareceu na qual entendeu que era o Senhor[6]. Viu também um ser humano alto que quis combater com ela, mas ela o venceu, e por isso entendeu que não eram feras que ela deveria combater, mas sim o demônio[7]. E depois ela foi martirizada, não pelas ferras, mas pelo ferro que despedaçou a sua carne[8].

            O relato de Felicidade

[1] Cfr. Ibidem, 3,9, pg. 119.

[2] Cfr. Idem, 4,1-10, pgs. 121-123.

[3] Cfr. Idem, 5,1-3, pg. 123.

[4] Cfr. Idem, 6,8, pg. 125.

[5] Cfr. Idem, 9, 2-3, pg. 129.

[6] Cfr. Idem, 10, 4, pg. 129.

[7] Cfr. Idem, 10,14, pg. 131.

[8] Cfr. Idem, 14,3, pg. 135.

Quanto à Felicidade, teve esta graça do Senhor. Ela estava grávida de oito meses no momento em que foi presa e aproximando-se o dia dos jogos onde seriam martirizados os cristãos, ela estava toda aflita pensando que a sua execução fosse adiada por causa de seu estado, pelo fato de que não era permitido submeter-se à execução as mulheres grávidas, para ser forçada a derramar o seu sangue santo e inocente[1] entre outras pessoas no caso delinqüentes, que não eram da comunidade cristã. Os outros estavam tristes ao pensar de deixar esta boa companhia a fazer sozinha a viagem, tanto esperada por todos como meta comum. Todos elevaram uma oração ao Senhor dois dias antes dos jogos. Quando terminou a oração apareceram as dores do parto, pois foi precoce o nascimento de modo que um guarda do cárcere disse a ela que se ela estava sofrendo, o que ela faria quando será dada às feras? Mas ela respondeu com fé e com amor que naquele momento era ela que estava sofrendo, o que deveria sofrer, mas depois será um outro que sofreria no lugar dela, porque ela estaria sofrendo o martírio para ele, no caso o Senhor Jesus Cristo. E ela deu à luz uma menina, que uma irmã na fé, a criou, como se fosse sua filha[2]. O juiz do tribunal permitiu que os encarcerados pudessem comer antes dos jogos e dos atos dos mártires. Naquele momento o suboficial do cárcere converteu-se ao cristianismo[3].

            O dia anterior aos jogos tiveram a graça da ceia livre, isto uma ágape, a eucaristia, onde todos se uniram ao redor do Senhor. Muitas pessoas acabaram se convertendo vendo a coragem e o amor das pessoas que estavam lá para subirem o martírio[4]. O autor relatou que chegou enfim o dia da vitória, na qual passaram da prisão ao anfiteatro como se fosse ao céu, exultantes e cheios de dignidade, com alegria e com amor estavam lá Perpétua, com um rosto luminoso, verdadeira esposa de Cristo, a predileta por Deus e tinha uma força no olhar que ninguém podia segurá-la[5] e também Felicidade, com rosto alegre porque tinha dado à luz uma menina, porque entregara a menina para que fosse cuidada por uma mulher da comunidade, para assim combater contra as feras, passando de sangue a sangue, decidida a se banhar, após o parto por um segundo batismo[6], o batismo de sangue, que para Tertuliano, que foi o relator desta paixão, era o batismo que completava aquele, da água. Enquanto alguns catecúmenos foram atingidos por animais ferozes, Perpétua e Felicidade também foram atingidas por um animal feroz atingindo as duas mulheres. Deram uns aos outros o óculo santo, para coroarem o martírio com este rito da paz[7]. As pessoas tiveram sofrimentos pelos animais e em seguida foram mortas pelos gladiadores. O autor terminou afirmando que os mártires foram fortíssimos e abençoados, porque chamados e eleitos a ter parte na glória do Senhor Nosso Jesus Cristo. Estas pessoas estiveram ligadas à Igreja, edificaram a comunidade eclesial e testemunharam o Espírito Santo até agora operante,

[1] Cfr. Idem, 15,3, pg. 135-137.

[2] Cfr. Idem, 15,4-7, pg. 137.

[3] Cfr. Idem, 16,4, pg. 139.

[4] Cfr. Idem, 17,3, pg. 139.

[5] Cfr. Idem, 18,2, pg. 139.

[6] Cfr. Idem, 18,3. pg. 139.

[7] Cfr. Idem, 21, 7, pg. 145.

e com o Onipotente Deus Pai e o Filho seu Jesus Cristo nosso Senhor, ao qual é esplendor e todo-poderoso pelos séculos dos séculos[1].

            O testemunho dos mártires dos primeiros séculos edifica a vida dos seguidores e das seguidoras de Jesus Cristo e de sua Igreja no mundo de hoje. Perpétua e Felicidade doaram as suas vidas pelo Senhor Jesus Cristo. O martírio foi visto como eleição, vocação onde Deus chamou pessoas e elas responderam positivamente para o chamado do Senhor. Vivamos bem o seguimento a Jesus Cristo para sermos fieis testemunhos do Senhor e assim a Igreja tenha mais intercessores junto do Intercessor Jesus Cristo, e de Deus Uno e Trino.

[1] Cfr. Idem, 21,1, pg. 147.

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