Marabá, 29 de março de 2024

Considerações sobre a homilia de São Basílio sobre o Logos, o Verbo de Deus.

13 de outubro de 2020   .    Notícias da Diocese

Considerações sobre a homilia de São Basílio sobre o Logos, o Verbo de Deus

Por Dom Vital Corbellini, Bispo de Marabá – PA.

São Basílio, bispo de Cesaréia no século IV, exerceu o seu episcopado, de 370 até 379, ano de sua morte. Ele combateu o arianismo, pois este sistema negava a divindade do Verbo de Deus junto a Deus Pai e a Deus Espírito Santo. Ele defendeu contra os arianos a divindade do Verbo, tomando como um dos textos escriturísticos Jo 1,1: ‘No principio era o Logos’, o Verbo de Deus, colocando a co-eternidade do Verbo de Deus em relação ao Pai, sua perfeita divindade, e distinção pessoal em relação ao Pai. Faremos uma análise sobre esta homilia que se tornou famosa em São Basílio pela defesa do Verbo na sua relação com o Pai sendo Deus como o Pai é Deus.

“No principio era o Logos”[1]

São Basílio afirmou que toda a palavra dos evangelhos é de significado superior em relação aos outros escritos da Sagrada Escritura, inspirados pelo Espírito Santo, porque se naqueles o Senhor falou por meio dos profetas, seus servos, nos evangelhos Ele nos falou na pessoa de Jesus Cristo. O bispo reconheceu que a mensagem evangélica mais eloqüente, mais forte e mais alta de toda a inteligência vem de João. Era admirado não só nos círculos cristãos, mas entre os pagãos por falar do Logos, expressão da filosofia grega, cujo significado é palavra. No caso para os cristãos tratou-se de uma pessoa, Jesus Cristo. Os cristãos deveriam sentir com fé as palavras no principio era o Verbo, jamais consentindo a superficialidade, mas a sua profundidade. Por isso quem estaria atingido pela beleza do pensamento e pela inacessível profundidade da doutrina e de não desejar a verdadeira compreensão? Se de fato não é oneroso admirar as coisas bonitas, mas compreender o que estamos admirados, sendo isso difícil de realizar-se[2].

O bispo de Cesaréia colocou em seguida a compreensão das palavras: “No principio era o Logos”. Quem pode compreender aquilo que se refere o principio? Em relação à teologia do Filho de Deus, João não assinalou ao Logos outro principio que o principio de todas as coisas[3]. O Espírito Santo iluminou o evangelista para que se dissesse isto do Senhor Jesus, que não tem princípio como o Pai não tem principio, de modo que se pudesse superar as idéias arianas que afirmavam em relação ao Filho que se foi gerado, ‘não existia’ e antes de ser gerado não existia, e, ele veio do nada para ter sua subsistência, de modo que essas idéias foram condenadas, e assim as pessoas eram chamadas a acreditar que ‘no principio era o Logos’.

São Basílio seguia as palavras do evangelho de São João para fugir do dano dos enganadores. Diante desses o fiel era convidado a dizer que no principio era o Logos,

[1] Jo 1,1. PG XXXI 472-481.

[2] Cfr. Basilio, Omelia su “In principio era il Logos”. Il Cristo, Volume II. Testi teologici spirituali in lingua greca das IV al VII secolo, 1, a cura de Manlio Simonetti, Fondazione Lorenzo Valla, Arnoldo Mondadori Editore, Verona, 1986, pg. 263.

[3] Cfr. Idem, 1, pg. 265.

jamais seguir os heréticos que se infiltravam nas comunidades para deturpar os fieis, pelo fato de que nós não compreenderemos a ponta extrema do principio e não encontraremos aquilo que é além do principio. Nesta vida existem muitos princípios, mas um só é o principio que está sobre todos, aquele que está além de todos[1]. E quando se pensa do principio sem principio é de algo superior, é das realidades divinas, na qual o próprio principio das coisas esteja dentro dos princípios, porque o Senhor é sem principio. O principio é sempre o que vai ao além e acima do nosso pensamento[2]. Por isso no principio era o Logos, como não dizer que tudo isso é maravilha, como todas as palavras se conectam entre elas com o mesmo valor. Assim são blasfemadoras e inimigas de Cristo as afirmações arianas que diziam que houve um tempo em que ele não existia. Mas se Ele era no principio, quando é que Ele não existiu?[3] Ele sempre existiu junto do Pai. Por isso não dá para colocar o tempo na eternidade, porque o Filho era no principio, e na medida em que se valoriza o verbo ‘era’ torna-se impossível dar lugar à impiedade blasfema[4] proveniente do arianismo.

Em sua homilia, São Basílio continuou uma pergunta: quem era no principio? O Logos está escrito. Será qual o logos, do ser humano ou dos anjos? Mas é preciso dizer que o logos, isto é a palavra seja aquela humana, seja aquela dos anjos não existia desde o inicio, porque essas coisas foram criadas pelo Criador. Toda a criação é posterior aos tempos, porque recebeu o principio do ser do Criador[5]. Mas nós devemos nos prender ao Logos que convém a Deus. De fato João falando do Unigênito, o definiu Logos, de modo que falou dele como luz, vida e ressurreição[6]. São Basílio convidou os fiéis a procurar o sentido verdadeiro do Logos, para não permanecer num conceito muito baixo, terreno. Por que é dito Logos? Porque veio fora do pensamento, foi gerado de uma forma impassível[7]. Ele é a imagem daquele que o gerou, que revela em si o Pai, sem dividir nada Dele e subsistindo perfeito por si[8].

João disse o Logos para apresentar a geração impassível do Pai, também para explicar a subsistência perfeita do Filho, e para demonstrar com aqueles conceitos a conjunção intemporal do Filho com o Pai[9]. O evangelista não disse no principio era o Filho, pois com a palavra filho, poderia insinuar a ideia da paixão, pelo fato de que quem gera, gera no tempo e com paixão. Por isso João preveniu os conceitos e afirmou no principio era o Logos.

São Basílio continuou a sua homilia afirmando com São João que o Logos era junto de Deus. Mais uma vez a palavra ‘era’ é usada para superar a blasfêmia da heresia

[1] Cfr. Ibidem, 1 pg. 265.

[2] Cfr. Idem, 2, pg. 267.

[3] Cfr. Ibidem, 2, pg. 267.

[4] Cfr. Idem, 2, pg. 269.

[5] Cfr. Idem, 3, pg. 269.

[6] Cfr. Idem , 3, pg. 271.

[7] Cfr. Ibidem, 3, pg. 271.

[8] Cfr. Ibidem, 3, pg. 271.

[9] Cfr. Ibidem, 3, pg. 271.

ariana que afirmava que não existia[1]. O bispo levantou algumas perguntas: onde era o Logos? Respondeu dizendo que não estava em nenhum lugar porque Ele não pode ser circunscrito. Mas onde ele era?! Ele era Deus[2]. Assim como o Pai é ilimitado, assim também o Filho é ilimitado. Tudo aquilo que é dito de Deus Pai deve-se dizer também de Deus Filho. Ele não disse que o Logos era em Deus, mas Deus, para apresentar-nos o caráter distintivo da Hipóstase, da Pessoa do Verbo.

São Basílio criticou o sistema herético monarquiano que afirmava que o Pai, o Filho e o Espírito Santo eram nomes de uma única entidade, negando as pessoas para salvaguardar a unidade em Deus[3]. Assim o evangelista João afirmou que o Logos era Deus e ele afirmou a doutrina em relação ao Unigênito, o Logos é Deus. Este deve ser adorado como Senhor, na qual no principio era o Logos junto a Deus Pai[4].

O bispo de Cesareia convidou os seus fieis para que se afastassem da doutrina ariana, da blasfêmia que tornava o Logos uma criatura do Pai na eternidade, de modo que era preciso sempre voltar às palavras do evangelho no principio era o Logos, e o Logos estava junto de Deus e o Logos era Deus[5]. Se o fiel repete novamente ‘era’, torna vã a expressão ‘não existia’, dos arianos. A homilia termina, chamando a todos para a submissão, a adoração a Deus, no Senhor nosso Jesus Cristo e em comunhão com o Espírito Santo para sempre[6].

A homilia de São Basílio na qual interpretou as primeiras expressões do evangelho de São João influenciaram a posteridade para que se firmasse sempre mais as decisões do Concílio de Nicéia (325) que o Filho é Deus, tendo a fundamentação bíblica, sobretudo em João que no principio era o Logos e o Logos era Deus.

[1] Cfr. Idem, 4, pg. 273.

[2] Cfr. Idem, 4, pg. 273.

[3] Cfr. Ibidem, 4, pg. 273.

[4] Cfr. Ibidem, 4, pg. 275.

[5] Cfr. Jo 1, 1-2., Ibidem, 4, pg. 275

[6] Cfr. Ibidem, 4, pg. 275.

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